Blog dos alunos da turma III da Especialização em Semiótica Aplicada à Literatura e Áreas Afins da Universidade Estadual do Ceará (UECE)

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Memória de Aula 01 por Ulisses Holanda de Oliveira

Nosso primeiro colaborador, obrigada!

Vamos ao texto:


Especialização em Semiótica Aplicada à Literatura e áreas afins
Ulisses Holanda de Oliveira
Professora Socorro Acioli
     Na formação da literatura brasileira, Antonio Candido não quer contestar nenhum ponto de vista em relação a esse assunto, mas quer defender a viabilidade do seu, que diz que a literatura brasileira é uma síntese de tendências universalistas e particularistas e ainda que elas não ocorrem isoladas. Para isso, defende uma distinção entre manifestações literárias e sistemas literários, com base em seu conceito de literatura como um sistema formado pela articulação entre autor, obra e público, todos cientes de seu papel, e que possui continuidade histórica, ou seja, forma uma tradição. Como crítico literário, Candido, em uma nota de rodapé de sua introdução, diz que a mesma é dispensável a quem não se interesse por questões de orientação crítica, podendo o livro ser abordado diretamente pelo capítulo I.

    Aí entram meus poucos conhecimentos sobre a questão da literariedade. O que é e o que não é literário? Um texto, como por exemplo, um diário escrito por um adolescente, poderia ser considerado uma obra literária? Quem determina que ele (o diário) entra ou não “num sistema de obras ligado por denominadores comuns” para ser enquadrado numa determinada fase? Candido nos aponta a questão da continuidade literária para que a atividade de certos escritores de um dado período se integre em um dado sistema e que cesse a partir do momento em que outro grupo recomece, numa espécie de transmissão de algo entre os homens, num ciclo de continuidade literária. Trocando em miúdos, são aquelas velhas questões didáticas de se repassar os conteúdos literários em forma de escolas literárias, fechando certos autores em grupos semelhantes e excluindo-se outros que dele não se assemelhem. É o que a partir de agora chamo de um “armário com gavetas, nas quais não se podem misturar certas obras e que para se passar de uma à outra é preciso que surja outra escrita diferente da que a antecedeu ou que pelo menos retome uma outra que antecedeu a sua antecessora. Entendeu?

    Professora, eis aqui um texto meu, escrito por mim no Curso da CESP, para minha admissão no seleto grupo de professores do Estado do Ceará. Curso esse no qual passei, diga-se de passagem. Gostaria de que você o lesse. É um memorial pedido na apostila de uma das disciplinas do curso.  Depois continuarei, ainda neste documento, com minha egoavaliação. Eis o texto:

    Na minha infância querida que os anos não trazem mais não tive familiares leitores. Não tive a tão desejada influência que desejamos muito que nossos alunos tenham em casa. Mas pelo menos tive sempre todos os livros que eram obrigatórios na lista de material escolar. Aprendi a ler e a escrever na alfabetização, não fiz os estudos anteriores ditos infantis.  E logo me deparei com um livro de Ruth Rocha. Um livrinho fininho que trazia em cada página uma letra do alfabeto bem desenhada, com traços de objetos do cotidiano. O nome não lembro bem, pelo menos até agora... Ele era amarelinho. Chamativo. Meu irmão tinha outro igual. Minha mãe comprava sempre os mesmos livros repetidos para os dois. Época boa, sem crises financeiras e preocupações vãs. Era orgulho para meus pais comprar todos os anos todos os livros em dose dupla, mesmo sendo iguais. “Cada qual terá seu livro”. Hoje em dia os pais não fazem isso. Por n aspectos. Estudava em escolas privadas. Minha primeira professora, a tia Mazé, ainda mora na minha rua. Sempre conversamos, quando dá. Um dia desses, ela me disse que quando eu terminava minha tarefa, corria e queria fazer a do meu irmão. Queria também ler por ele, para ele não passar vergonha. Na época não entendia bem porque eu fazia isso. Hoje eu já sei; minha mãe teve um problema no parto e faltou oxigênio para ele, para o cérebro dele. Ele ficou fadado ao insucesso escolar. Mas hoje ele está muito bem, é o que importa. Minhas primeiras experiências com as letras foram boas, com os paradidáticos também. Eram livros bons, leituras agradáveis. A tia lia com a gente! A turma adorava. Não tinha essa história de celulares, mp3, computadores... A vida era simples em muitos aspectos, mas era estimulante. Pouca poluição, poucos carros nas ruas, avenidas não perigosas, a vida era boa, muito simples e agradável. Ganhei uma lousa na infância, dessas a giz. Era brincadeira de escola. Brincava de professor com meus colegas. Isso na minha rua, pois com meus amigos da escola o contato era pouco. Não lia muitos livros, mas sempre tinha curiosidade quando me deparava com um. Principalmente se ele fosse recheado de gravuras. Mas aí chego à sexta série e o professor obriga a turma a ler Iracema. Foi um choque. Leitura repugnante, só anos mais tarde percebi, nas vésperas do vestibular, o quão bom era o livro de Alencar. Adorei muito ao ponto de depois, na Universidade Estadual do Ceará, buscar de novo essa leitura. E acho que já o li três vezes. Isso em português, porque andei lendo Iracema em Francês. No seu centenário. Isso mesmo. Quando Iracema completou cem anos de vida. Confesso que somente vim me interessar por leituras, por literatura mesmo na faculdade de Letras. A partir de 2003. Mas sei que não foi tarde. Nunca é tarde para ser feliz. Hoje leio na medida do possível. Leio literatura brasileira, francesa e espanhola. Leio os Best-sellers. Leio crônicas, contos, páginas de Orkut, perfis entre muitos outros textos. Escrevo muito quando sou solicitado, mas não escrevo profissionalmente. Tenho vontade de escrever um livro. Mas sei que o medo não deixa; já tentei algumas vezes começar. Será que esse memorial poderia ser um início para ele? Quem sabe? Lembrei o nome do livro de Ruth Rocha: “A palavra e a palavra”, não tenho agora a absoluta certeza, pois li um livro de um cearense com o mesmo título. Não importa! O que me importa é que a leitura de mundo, que antecedeu e antecede ainda todo esse meu processo de aquisição da leitura e da escrita, sempre foi e sempre será variado, haja vista ser para mim uma necessidade social. Afinal, a leitura é o momento de estarmos sós e ao mesmo tempo acompanhados. Bem acompanhados!

    Voltando às minhas iniciais reflexões: seria este texto um fragmento de uma (possível) obra literária? Antonio Candido nos diz em sua introdução que é preciso averiguar quando e como se definiu uma continuidade ininterrupta de obras e autores, cientes quase sempre de integrarem um processo de formação literária. Se hoje em dia denomina-se a literatura atual em literatura contemporânea, que é uma mistura de escrituras e escritores e escolas e obras universalistas e particularistas etc., seria esse texto o quê? Literário? Não-literário? Contemporâneo?

Professora, se você acha que eu viajei, mande-me um retorno rápido que eu refaço minhas (borbulhantes) idéias. Depois mando uma reflexão do texto do Márcio Selligman Silva da UNICAMP.

Espero resposta!

Ulisses


Como foi dito e discutido em sala, o leitor comum é aquele que lê uma obra (um livro, um texto qualquer literário) e somente o faz por prazer, por fruição; sentado em cadeira ou numa rede por diversão ou hobby. Não vê o material lido como uma obra que pode ser analisada em diversas perspectivas, análises ou concepções. Ele está distante do que se convencionou de crítica literária. Já o leitor crítico, mesmo não conhecendo as teorias literárias, ou os seus pensamentos ditos críticos, pensados dentro de círculos literários completamente diferentes, este analisa a obra do ponto de vista de uma determinada percepção da qual mais ele se apropria.  É importante frisar que uma obra literária pode ser interpretada de várias maneiras, é o que Umberto Eco chamou de obra aberta. “Não existe uma leitura que não seja interpretativa” assim “como toda leitura é releitura e apropriação”. Portanto a obra literária, o fenômeno literário deve ser analisado de acordo com a maneira como seu leitor enxerga o mundo, mesmo esse leitor não conhecendo as teorias literárias. Muitas vezes esse leitor comum lê uma obra e nem para para pensar se se trata mesmo de uma obra literária, como se diz por aí, se essa obra tem a tão famigerada literariedade. Ler é mais importante.

Professora, outras ideias surgirão depois...

rsrsrs

Ulisses Holanda

3 comentários:

  1. Sobre o não-literário... Isso é tão complicado né? Às vezes expressarmos nossa humilde opinião pode ser ocasião de ser tachados de preconceituosos. Já sentiu isso?

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