Blog dos alunos da turma III da Especialização em Semiótica Aplicada à Literatura e Áreas Afins da Universidade Estadual do Ceará (UECE)

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Memória de Aula 06 por Wadlia Araújo Tavares


Ler um texto teórico começando pelo meio e sem ter os textos que estão sob análise, para que eu pudesse visualizar as hipóteses, foi um tanto desafiador. Porém vi coisas interessantes mesmo diante destes “pequenos” obstáculos. Mesclarei minhas observações sobre o texto e aquilo que foi discutido em sala. Antes de começar, é preciso dizer que Literatura Comparada sempre foi algo que quis entender, mas nunca tive a oportunidade. Então uma definição surge:

É a forma específica de interrogar os textos literários na sua interação com outros textos, literários ou não, e outras formas de expressão cultural e artística[1]

Ou ainda:

                (Não é só) o confronto entre obras ou autores...[2]

É ainda uma metodologia, uma forma de pensar a literatura que não se encaixa em corrente ou escola literária, porém é inegável que seu maior desenvolvimento deu-se através da Estética da Recepção e tal conclusão não é absurda, pelo contrário, em minha leitura percebi vestígios de Jauss no escrito proposto.

Um gráfico foi mostrado e este aponta o percurso e as influências que o texto literário sofre:
















 
[gráfico suprimido por questões de formatação]

HISTÓRIA DA LITERATURA CONTEMPORÂNEA
 É sempre fascinante o poder de síntese de um gráfico. Percebemos que o Texto Literário (A) recebe distintas influências para fundar-se. Depois, com a tradução e edição , ele se refaz (pois a tradução é uma ‘traição’ ao texto a que se refere e a edição com seus acréscimos e subtrações criam uma nova ‘coisa’) .  Em seguida, temos a publicação, crítica e adaptação (com estes elementos, novidades baseadas em (A) chegam ao público). Findo este processo, o Texto Literário (B) não é mais aquele manuscrito entregue ao editor pelo escritor. Temos agora o produto final de um processamento (cuidadosamente, às vezes) pensado.

Vimos também um breve histórico da Literatura Comparada delineado por Tânia Franco Carvalhal. Transcreverei as partes que me parecerem mais interessantes e tentarei comentá-las.
Em 1816, surge o Curso de Literatura Comparada. A institucionalização já mostra maior interesse neste campo de estudo. Em 1829, Villemain[3] emprega o termo Literatura Comparada, porém seu maior divulgador será Ampére[4] por meio de Saint-Beuve (crítica biográfica). Em 1887 e 1910, respectivamente, teremos a primeira cátedra em Lyon e Sorbonne. A visibilidade da teoria ganha força e respaldo nas principais universidades da Europa. Em 1887 e 1910, na Alemanha, ter-se-á um periódico da disciplina comparativista. Em Portugal, o precursor é Teófilo Braga[5]. Em 1964, no Brasil, Tasso de Oliveira[6] argumenta que

Em Literatura Comparada, verifica-se a filiação de uma obra, autor/movimento de um país aos de outros países.

Um pouco elementar parece o argumento de Tasso de Oliveira, porém é necessário notar que tudo era um grande começo que hoje podemos ver que foi importante foi (e às vezes confuso).

Neste momento da aula, a professora pediu a alguns alunos para que mencionasse os autores que foram trabalhados por eles ao longo de sua graduação. Estou, heroicamente, tentando terminar a segunda graduação, mas pude lembrar-me de alguns nomes que hoje percebo como foram importantes para minha formação como: Horácio Dídimo, Clarice Lispector, Camilo Castelo Branco, Mario de Andrade, Vélez Guevara, Machado de Assis, Sófocles, Oliveira Paiva, José Saramago, Castro Alves, Cecília Meireles, entre outros.

 Descobrir que a palavra-chave para LC[7] é a leitura foi curioso afinal é sim a partir de tudo que já foi lido pelo analista que as relações se estabelecem e assim as comparações poderão ser cogitadas. O caminho é diverso, mas cheio de ‘estrelas’ como a Intertextualidade[8] que se apresenta como uma das possibilidades.  
A experiência com Jauss foi tão forte que pude percebê-lo no início do texto de Tânia Franco Carvalhal:

... Ao lermos um texto, estamos lendo, através dele, o gênero a que pertence e, sobretudo, os textos que ele leu (aí não exclusivamente literários).

Ao ler o trecho acima, questionei-me acerca de uma idéia, daquilo que Jauss mencionou em texto, de série literária. Adoraria saber se tal raciocínio é plausível.

Não conhecia as reflexões de Harold Bloom acerca das interferências de um texto em outro[9]. O paralelo sugerido com a mitologia grega por meio dos personagens Laio e Édipo (a influência que o primeiro exerceu sobre o segundo) e que esta “influência” não é nada boa, talvez seja o grande mérito de tal possibilidade analítica dentro da Literatura Comparada. Tudo o que vem depois disso: a psicologia com instrumento de interpretação e os procedimentos a serem seguidos para que seja observada tal influência no fazer literário do poeta sob análise é no mínimo vaga, mas possivelmente considerada como exercício inicial de comparação literária.

Porém como mencionei em sala de aula, nada foi tão exuberante quanto às idéias de T.S. Eliot e J. L. Borges. Para CARVALHAL (p. 62), Eliot constata que é a singularidade que os peculariza.  O conceito de tradição é mais amplo que não é só herança mas também implica em esforço e alimenta-se de um senso histórico[10]. Este propõe uma interação entre passado e presente. Com isso, uma vez mais, pude lembrar de Jauss e da Estética da Recepção.

A síntese dos pressupostos elotianos foi necessária para que se veja como eles abalam a noção convencional de modelo, pois se distanciam da idéia de reprodução (a nova obra não copia a obra anterior) para se ampliarem num significado maior, de atitude crítica (não na acepção negativa que tem a palavra, mas no que concerne a uma criação que tem consciência daquilo que a antecedeu e por isso tem mais liberdade em até utilizar a obra anterior no processo criativo atual) que a nova obra adota em relação áquelas que a antecederam.

Já Jorge Luis Borges, ao reunir textos que teriam sido fontes de Kafka, observa que estes textos são heterogêneos, porém cada um destes se parece com os textos kafkanianos. A obra nova (Kafka) salienta os textos anteriores, antes esquecidos ou desconhecidos, conferindo-os um sentido que antes não existia.

Borges desloca o ângulo de observação (a investigação começa pela obra ‘nova’), reverte a cronologia (com a ‘nova’ obra, chega-se aos textos-fonte), quebra com o sistema hierárquico (a hierarquia até então posta de obra ‘antiga’, sendo primeira e mais importante e, depois, obra ‘nova’, secundária e de valor também segundo) que nela se apoiava.

Logo depois, Borges afirma, brilhantemente:

                Cada escritor cria seus precursores.

As noções de autoria e originalidade expostas no conto “Pierre Menard, autor do
Quixote” são extremamente interessantes e fez-me lembrar de Giles Deleuze[11] que, em sua

tese de doutoramento, diz:

                O grau máximo da diferença é o que existe na representação de algo idêntico.

Como é impossível fazer a mesma coisa duas vezes afinal as condições ambientais, sociais e psicológicas não são as mesmas. Assim, ao copiar o Dom Quixote, Menard o reconstrói.
Antes do fim da aula algumas questões foram propostas para que juntos pudéssemos respondê-las:

1)      Quais as relações entre influência literária e dependência?
2)      Quais os limites entre imitar e recriar a partir da influência?
3)      Como as influências de diversas artes e mídia têm  construído a noção de literatura contemporânea?
4)      Quais as influências do autor escolhido como objeto de estudo?

São perguntas atraentes, mas que devo deixar o prazer de respondê-las para outra memória já que esta há muito se estende. Pude articular conhecimentos alheios à disciplina e para mim foi como uma vitória pessoal. Percebi que tenho ‘conteúdo’!
Até a próxima memória!


[1] CARVALHAL, Tânia Franco. Literatura Comparada. São Paulo: Ática.
[2] Idem. Outras transcrições do texto de CARVALHAL estão no ‘corpo’ da ‘memória’ em itálico
[3] Abel-François Villemain (Paris, 9 de junho de 1790 – Paris, 8 de maio de 1870) foi um político e escritor francês. Nasceu em Paris e foi educado no Lycée Louis-le-Grand. Tornou-se assistente mestre no Lycée Charlemagne, e posteriormente, na École Normale. Em 1812 ganhou um prêmio da Academia com um ensaio sobre Michel de Montaigne. Sob a restauração, foi nomeado, primeiramente, professor adjunto de História moderna, e em seguida, professor de eloquência francesa na Sorbonne. Aqui ele fez uma série de palestras literárias que teve um extraordinário efeito sobre os seus contemporâneos mais jovens.
Villemain tinha a grande vantagem de chegar um pouco antes do movimento romântico, de ter um grande amor pela literatura, sem ser um extremista. A maioria da juventude intelectual da brilhante geração de 1830 passou por sua influência, e, enquanto satisfazia os românticos pela sua apreciação franca das belezas das poesias inglesa, alemã, italiana e espanhola, não condena os clássicos - ou os clássicos propriamente ditos da Grécia e Roma ou o assim chamados clássicos da França. Em 1819 publicou um livro sobre Oliver Cromwell, e dois anos depois, foi eleito para a Academia Francesa. Villemain foi nomeado pelo governo da restauração Chef de l'imprimerie et de la librairie, um posto que envolvia um tipo de censura irregular da imprensa e, posteriormente, para o cargo de mestre de petições. Antes da Revolução de Julho ele havia sido destituído do seu cargo por suas tendências liberais, e foi eleito deputado por Évreux. No reinado de Luís Filipe, recebeu uma pariato em 1832. Era um membro do conselho da instrução pública, e foi duas vezes ministro do referido departamento, e também tornou-se secretário da Academia Francesa. Durante todo o período que durou a Monarquia de Julho, ele foi um dos principais distribuidores do mecenato literário na França, mas nos seus últimos anos sua reputação diminuiu. Morreu em Paris. A obra principal de Villemain é o seu Cours de la littérature française (5 vols., 1828-1829). Entre suas outras obras estão: Tableau de la littérature au Moyen Âge (2 vols., 1846); Tableau de la littérature au XVIII siècle (4 vols., 1864); Souvenirs contemporains (2 vols., 1856); Histoire de Grégoire VII (2 vols., 1873; Engl. trans., 1874). Entre os estudos críticos sobre Villemain podem ser citados: o de Louis de Loménie (1841), E. Mirecourt (1858), J.L. Dubut (1875). Veja também Sainte-Beuve, Portraits (1841, vol. iii), e Causeries du lundi (vol. xi, "Notes et pensées"). Em < http://pt.wikipedia.org/wiki/Abel-Fran%C3%A7ois_Villemain>, acesso em 29/10/2010, às 21h50.
4  Jean-Jacques foi um importante historiador da literatura e viajante e encontra-se   entre os precursores da Literatura Comparada. Em < http://pt.wikilingue.com/es/Andr%C3%A9-Marie_Amp%C3%A8re >, acesso em 29/10/2010, às 22h00.
5 Joaquim Teófilo Fernandes Braga (Ponta Delgada, 24 de Fevereiro de 1843Lisboa, 28 de Janeiro de 1924) foi um político, escritor e ensaísta português. Estreia-se na literatura em 1859 com Folhas Verdes. Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, fixa-se em Lisboa em 1872, onde lecciona literatura no Curso Superior de Letras (actual Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa). Da sua carreira literária contam-se obras de história literária, etnografia (com especial destaque para as suas recolhas de contos e canções tradicionais), poesia, ficção e filosofia. Depois de ter presidido ao Governo Provisório da República Portuguesa, a sua carreira política terminou após exercer fugazmente o cargo de Presidente da República, em substituição de Manuel de Arriaga, entre 29 de Maio e 4 de Agosto de 1915. Em < http://pt.wikipedia.org/wiki/Te%C3%B3filo_Braga>, acesso em 29/10/2010, às 22:10.
6 Tasso da Silveira (Curitiba PR, 1895 - Rio de Janeiro RJ, 1968) formou-se bacharel em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais, no Rio de Janeiro, em 1818, mesmo ano em que publicou seu primeiro livro de poesia, Fio d'Água. No ano seguinte, fundou e tornou-se diretor das revistas Os Novos, Árvore Nova, Terra do Sol, com Álvaro Pinto, América Latina, com Andrade Muricy e Cadernos da Hora Presente, com Rui de Arruda. Colaborou nos jornais O Momento, Rio-Jornal, A Manhã, e na Revista Sul-Americana. Foi secretário dos jornais Diário da Tarde e O Estado e redator do Diário da Manhã. Em 1927 fundou a revista Festa, com Andrade Muricy, publicada até 1928. Elegeu-se deputado estadual em Curitiba PR, em 1930. Nas duas décadas seguintes foi professor catedrático de Literatura Portuguesa na Universidade Católica e de Literatura Brasileira no Instituto Santa Úrsula, no Rio de Janeiro. Foi também funcionário da Casa da Moeda, entre 1930 e 1960. Em 1956, foi homenageado com o prêmio Machado de Assis, concedido pela Academia Brasileira de Letras para o conjunto de sua obra. Fazem parte da obra poética de Tasso de Oliveira os livros As Imagens Acesas (1928), Definição do Modernismo Brasileiro (1932), Contemplação do Eterno (1952), Regresso à Origem (1960) e Puro Canto (1962), entre outros. Sua poesia filia-se à segunda geração do Modernismo. Em < http://www.astormentas.com/din/biografia.asp?autor=Tasso+da+Silveira>, acesso em 29/10/2010, às 22:20.
[7] Lê-se Literatura Comparada.
[8] Conceito de Gérald Genette: tudo que coloca (um texto) em relação, manifesta ou secreta, com outros textos.
[9] CARVALHAL, Tânia Franco. Literatura Comparada. São Paulo: Ática. Pág. 55
[10] É uma percepção ao só do passado, mas de sua atualidade no presente. In. CARVALHAL, Tânia Franco. Literatura Comparada. São Paulo: Ática. Pág.62
Concluído o curso em 1948, ele dedica-se à história da filosofia. Em 1968, Deleuze apresenta como tese de doutoramento Diferença e Repetição (Différence et répétition), orientado por Gandillac, na qual critica o conhecimento via representação mental e a ciência derivada desta forma clássica lógica e representativa; e como tese secundária, Spinoza e o problema da expressão (Spinoza et le problème de l’expression) orientado por Alquié. No mesmo ano, ele conhece Félix Guattari, e este encontro resulta em uma longa e rica, e considerada por muitos controversa, colaboração. Segundo Deleuze: "meu encontro com Félix Guattari mudou muitas coisas. Félix já tinha um longo passado político e de trabalho psiquiátrico."" Na Universidade de Vincennnes, onde ensinou até 1987, Gilles Deleuze promoveu um número significativo de cursos. Graças a sua esposa, Fanny Deleuze, uma parte importante destas aulas foi transcrita e disponibilizada no sítio de Richard Pinhas (webdeleuze). Para Deleuze, "a filosofia é criação de conceitos" (O que é a filosofia?), coisa da qual nunca privou-se (máquinas-desejantes, corpo-sem-órgãos, desterritorialização, rizoma, ritornelo etc.), mas também nunca se prendeu a transformá-los em "verdades" a serem reproduzidas. A sua filosofia vai de encontro à psicanálise, nomeadamente a freudiana, que aos seus olhos reduz o desejo ao complexo de édipo (ver O Antiédipo - Capitalismo e Esquizofrenia, escrito com Félix Guattari), a falta de algo. A sua filosofia é considerada como uma filosofia do desejo. Desejo entendido como vontade de potência (aquele que Nietzsche inaugura), como criação de fluxos de vida. Desejo como puro devir. Com a crítica radical do complexo de édipo, Deleuze consagrará uma parte de sua reflexão à esquizofrenia. Segundo ele, o processo esquizofrênico faz experimentar de modo direto as "máquinas-desejantes" e é capaz de criar (e preencher) o "corpo-sem-órgãos". No entanto, é preciso não confundir Deleuze com um "panfletário da loucura", é o de problematizar a organização das lógicas vigentes. Na verdade, seu intuito sempre foi o de explorar as suas potencialidades. Em Mil Platôs, Deleuze e Guattari enfatizam a necessidade de extrema prudência nos processos de experimentação. Deleuze sempre advertiu quanto ao perigo de se tornar um "trapo" através de experimentações que inicialmente poderiam ser positivas: "a queda de um processo molecular em um buraco negro" (Diálogos, p. 167). Deleuze morreu em 4 de novembro de 1995. A sua morte ainda não está bem esclarecida: é disseminada a versão de que o filósofo francês suicidou-se depois de lhe ter sido diagnosticado um cancro (tumor) terminal. Mas tal fato não pode ser confirmado.
Deleuze sofria de tuberculose desde a juventude (período em que os tratamentos disponíveis não eram eficazes), o que, nos últimos anos de sua vida, acabou evoluindo para uma forma grave de insuficiência respiratória. Amigos próximos advogam que Deleuze caiu acidentalmente, em função de seu estado debilitado, da janela do hospital em que estava internado, outros problematizam a intencionalidade de seu ato. "São os organismos que morrem, não a vida." Em < http://pt.wikipedia.org/wiki/Gilles_Deleuze>, acesso em 29/10/2010, às 23:20.

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